Virgolina, uma virgem batida de
meia-idade, sentou-se e pediu uma Coca-Cola. O empregado, alto e loiro,
questionou com ar trocista:
- Coca-Cola não temos. Pode ser
Pepsi?
- Pode – respondeu Virgolina olhando para o relógio,
como se esperasse alguém.
O empregado colocou sobre a mesa a
lata de refrigerante, um copo com uma rodela de limão e uma palhinha.
Virgolina encheu o copo, ignorou
a palhinha e bebeu o conteúdo de um trago. As borbulhas gás precipitaram-se no
estômago vazio, fazendo-a estremecer. Foi invadida interiormente por uma náusea
momentânea. Sentiu o refluxo gasoso subindo vertiginosamente e soltou um vibrante e sonoro arroto,
que pareceu prolongar-se por infindáveis segundos. Todos os olhares de
reprovação e censura das mesas circundantes fixaram-se nela e Virgolina sentiu
necessidade de se explicar e de tomar uma posição firme:
- Nunca bebam Pepsi! Esta bebida
é horrível e fez-me arrotar sem querer. Que porcaria… por favor passem esta
mensagem, que ninguém beba Pepsi! É importante que todos se unam e nunca mais
bebam Pepsi!
- Com licença?! – advertiu uma
sexagenária que comia uma torrada a duas mesas de distância.
- Perdão minha senhora. Com licença
– retorquiu Virgolina envergonhada mas com uma pequena sensação de gozo, a de ter
desferido uma estocada fatal no refrigerante inconveniente, que
agora iria sentir nas vendas o resultado da sua indignação. Ela tinha a certeza
que o movimento iria crescer e tornar-se imparável. Prova disso era a
manifestação espontânea de apoio que acabava de testemunhar ao ver as pessoas quase
mecanicamente e em simultâneo a erguerem o punho cerrado enquanto gritavam em
uníssono – Pepsi nunca mais! Pepsi nunca mais! Pepsi nunca mais!
Alguns segundos depois chegava
Coelho, um tipo execrável que habitualmente abusava dela. Pegou-lhe no braço com
brusquidão e arrastou-a para a casa de banho contra a sua vontade. Subiu-lhe a
saia e arrancou-lhe as cuecas, empurrando-a contra a parede fria. Virgolina
implorou, usando o argumento recorrente:
- Não! Não! Por favor não, que eu
sou virgem!…
Coelho respondeu indiferente:
- Pois que seja, vou-te sodomizar
outra vez. Como habitualmente…
Pouco depois de Coelho ter
abandonado a casa de banho com ar indiferente, Virgolina saíu do pequeno
cubículo envergonhada, procurando algum sinal de compaixão nos rostos que momentos
antes tinham reprovado o seu comportamento mas que depois lhe tinham dado a sua solidariedade. Porém, nem um olhar de complacência. A nota dominante era uma
espécie de torpor colectivo e um estranho esforço de indiferença. Todos figiam não reparar no sucedido.
Virgolina sentiu vontade de
gritar, de pedir ajuda para denunciar o abusador, de desmascará-lo, de o
castigar, mas conteve dentro de si toda a raiva e humilhação. Afinal arrotar
inadvertidamente em público era bem mais desconcertante do que ser sodomizada
em segredo por Coelho. Pelo menos continuava virgem.
Sentou-se novamente à mesa e
pediu uma 7UP. Sete, o número de Cristiano Ronaldo, o melhor do mundo. A ideia
reconfortou-a, mesmo sabendo que o refrigerante que pedira era extremamente rico em gás.
É verdade Relaxoterapeuta, é mais fácil protestar contra a Pepsi do que correr com o Coelho do governo. Bem caçado.
ResponderEliminarBem se às vezes o Relaxoterapeuta não é fácil de decifrar, desta vez esmerou-se. Arrotar postas de pescada impante de soberba, e depois ser corneado qual noiva semi virgem abandonada no altar, trocada por outra mais madura e bem mais matreira, enfim já desmamada. Bem feito.
ResponderEliminarMuito boa a sua opinião. Texto fenomenal. Uma clarividência digna de ser notada.
EliminarSoberba não, SOBERBO!!!
EliminarSoberbo não! Soberba sim
EliminarEntre um arrote de Pepsi e o culto do CR7, o melhor do Mundo, não sobra tempo para reparar nos humilhados e ofendidos, nem para dar nome aos bois que, todos os dias, nos agridem e ofendem.
ResponderEliminarTexto bem caçado, como sempre.