21/02/11

Mandrake




Lúcia, uma vizinha minha, divorciada e com uma catrefada de garotos, que em cachopa até era toda jeitosa mas que se deixou engordar mais de duas arrobas logo após a primeira gravidez, passou por mim fina que nem um palito, com o nalgueiro reduzido a um terço, as maminhas a metade e o rosto, habitualmente roliço e carnudo, revelando alguns dos traços que a haviam tornado apetecível noutros tempos - “Porra vizinha Lúcia, nem a estava a reconhecer!... Está toda elegante… anda a fazer dieta ou fez uma plástica?” A mulher corou de raiva e respondeu com aspereza: “O raio que o parta, seu Don Juan de meia tigela, acabou-se foi o fundo de desemprego e agora como merda!”. Pelo tom de voz e pela riqueza do léxico, pressenti de imdediato que o galanteio tinha sido desadequado e que tinha irritado a pequena. Mas como tenho o coração ao pé da boca e o verbo na ponta da língua, já não fui a tempo de evitar um inconveniente piropo à matador: “Mas olhe que pelos vistos tem-lhe feito bem!...” Acto contínuo, a mulher assentou-me duas galhetas e seguiu passeio fora a praguejar.
Magoado no ego e com as bochechas a arder, tentei recobrar o ânimo e a dignidade ultrajada pela mal-agradecida lambisgóia. Foi então que entendi o alcance do desabafo do engenheiro Pinto de Sousa - "Não percebo como algum líder fica maldisposto quando os números são bons". E eu também não caro Pinto de Sousa. Bom, estamos a falar de números de circo, certo?


4 comentários:

  1. Meu Caro
    Abençoadas "galhetas"...
    E já agora, obrigado por me fazer rir neste inicio de dia. Acredite que não é coisa muito fácil.

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  2. Caro Relaxoterapeuta,
    Nas ventas. Não direi justiçado, mas agradeço-lhe o reconforto da metáfora das galhetas. Acho que até os “amigos”, no íntimo, gostavam da ideia, no mínimo dois calduços. Mesmo que ele dissesse que é falta de educação. Longe da Marinha, para não reforçar os apoios.

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  3. Caro Relaxoterapeuta

    Este post tem a data de 21 de Fevereiro. Foi há muito tempo.
    Confesso que não tenho bitaitado, porque não me sinto capaz de comentar textos desta qualidade, mas que gosto de os ler, lá isso gosto.
    No universo da mediocridade e da maledicência dos imitadores de defuntos projectos, faz-me falta a sátira fina, as frases de construção cénica excepcional e o gozo de decifrar a mensagem que está lá sempre.
    Se se sentir cansado, nada melhor que uma massagem para relaxar.
    Passe bem e obrigado.

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  4. Caro Vinagrete

    apreciei bastante a sua mensagem.
    Sabe que por vezes mais vale estarmos calados do que acrescentarmos ruído ao ruído. E depois há o reumatismo, os bicos de papagaio e algum desencanto com os dias que vamos vivendo, na cidade, no país e no mundo. Confesso.

    Cumprimentos.

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